Crianças e uso das telas
- Effects Digital Marketing
- 22 de set.
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Nos últimos anos, a tecnologia tem transformado radicalmente a forma como vivemos, trabalhamos e nos relacionamos. Se por um lado ela trouxe avanços incontestáveis, por outro, também criou desafios inéditos para a saúde mental e emocional, principalmente quando pensamos no público infantil.
O uso abusivo de telas por crianças é um tema cada vez mais discutido entre pais, educadores e profissionais da saúde. Tablets, celulares, videogames e televisões passaram a ocupar um espaço significativo no cotidiano das famílias, muitas vezes substituindo brincadeiras ao ar livre, interações sociais e até mesmo momentos de descanso. Mas quais são os riscos dessa exposição excessiva? E como podemos construir uma relação mais saudável das crianças com o mundo digital?
O fascínio das telas e a sensação de alienação
Segundo Anjos e Francisco (2021), a tecnologia tem produzido mudanças profundas no comportamento humano, chegando ao ponto de provocar alienação. Muitas pessoas relatam que, ao ficarem desconectadas, sentem angústia, tristeza ou desamparo, como se estivessem perdendo algo essencial. Essa sensação se torna ainda mais preocupante quando falamos de crianças, que estão em fase de desenvolvimento e ainda não possuem recursos internos suficientes para lidar com esse tipo de frustração.
As telas são projetadas para prender a atenção. As cores vibrantes, os sons, as notificações constantes e a lógica dos jogos eletrônicos ativam áreas do cérebro ligadas à recompensa, tornando difícil largar o dispositivo. Para as crianças, que ainda estão aprendendo a lidar com limites e autorregulação, esse estímulo pode se transformar rapidamente em dependência.
O lado obscuro da tecnologia para as crianças
É inegável que a tecnologia também oferece benefícios. Jogos educativos, vídeos interativos e plataformas de aprendizagem podem estimular a curiosidade e auxiliar no processo escolar. No entanto, como apontam Aragão et al. (2019), o uso abusivo das telas está relacionado ao surgimento de problemas como ansiedade, dificuldades de concentração e impulsividade.
Muitos pais permitem, consciente ou inconscientemente, que seus filhos usem celulares e tablets como substitutos de brinquedos. Em situações do dia a dia, como restaurantes ou filas de espera, é comum ver crianças entretidas com vídeos ou jogos. Embora essa prática alivie o momento imediato, a longo prazo ela pode comprometer o desenvolvimento emocional, social e cognitivo.
O Brasil no ranking mundial de uso de telas
Um dado alarmante reforça essa preocupação: segundo o jornal da USP, Brasil e Indonésia dividem o pódio entre os países que mais usam celulares entre 17 nações pesquisadas (CÂMERA et al., 2020). Isso mostra que o problema não é pontual, mas sim cultural, refletindo o estilo de vida contemporâneo, em que a conectividade parece ser uma necessidade constante.
Com a pandemia da Covid-19, esse cenário se intensificou. As crianças passaram a depender das telas não apenas para lazer, mas também para estudar e interagir socialmente. O resultado, segundo Nobre et al. (2021), foi o aumento significativo de problemas como atenção prejudicada, impulsividade e dificuldades emocionais. Hoje, cerca de 90% das crianças e adolescentes brasileiros usam as telas como principal meio de distração, especialmente plataformas como YouTube e jogos online.
Quanto tempo de tela é saudável?
A Sociedade Brasileira de Pediatria e outros órgãos de saúde estabelecem diretrizes claras sobre o tempo de tela adequado para cada faixa etária (Abrantes; Almeida, 2018):
Menores de 2 anos: nenhum contato com telas.
De 2 a 5 anos: até 1 hora por dia.
De 6 a 10 anos: entre 1 e 2 horas por dia.
De 11 a 18 anos: entre 2 e 3 horas por dia.
Essas recomendações servem como um cronograma de proteção. Elas não visam apenas reduzir o tempo, mas principalmente incentivar atividades alternativas que estimulem o desenvolvimento saudável, como brincar ao ar livre, praticar esportes, ler e conviver com outras crianças.
O que dizem os estudos recentes
Três pesquisas ajudam a compreender melhor os impactos do uso abusivo de telas em crianças:
Cerimonial et al. (2023) – Mostram que muitos pais permitem o acesso a dispositivos desde muito cedo, até mesmo em bebês de 0 a 1 ano. Essa exposição precoce está associada a maior risco de cyberbullying e problemas emocionais.
Joung, Oh e Lee (2023) – Reforçam que o contato excessivo com telas nas primeiras idades prejudica o desenvolvimento cognitivo e emocional, pois reduz oportunidades de interação social e experiências reais de aprendizado.
Guedes et al. (2019) – Revelam que 19% das crianças passam mais de duas horas por dia em frente às telas, realizando atividades variadas como assistir vídeos, ouvir música e jogar. Além disso, destacam que o papel dos pais é crucial: 86,4% deles afirmaram limitar o tempo de uso, mostrando que a supervisão pode atenuar os efeitos negativos.
Esses estudos convergem em um ponto central: a tecnologia em si não é o problema, mas sim a forma como é utilizada. A ausência de limites claros e de orientação parental transforma um recurso potencialmente educativo em um risco para a saúde mental.
Impactos psicológicos e sociais
O uso abusivo de telas pode trazer uma série de consequências para crianças e adolescentes:
Problemas de sono: a luz azul emitida pelos dispositivos inibe a produção de melatonina, dificultando o descanso.
Aumento da ansiedade e da depressão: a exposição contínua a estímulos digitais intensifica sentimentos de comparação, insatisfação e agitação.
Prejuízos na atenção e no rendimento escolar: quanto maior o tempo de tela, menor a capacidade de concentração em atividades que exigem foco prolongado.
Redução da interação social: brincar e se relacionar pessoalmente é essencial para desenvolver empatia, comunicação e resolução de conflitos.
Riscos de cyberbullying: o uso precoce e sem supervisão pode expor crianças a situações de violência digital.
Esses impactos não afetam apenas o indivíduo, mas a sociedade como um todo. Quanto mais crianças crescem dependentes de telas, maiores são os índices futuros de adultos ansiosos, depressivos e com dificuldades de autorregulação.
O papel dos pais e cuidadores
A responsabilidade de mediar a relação das crianças com a tecnologia recai principalmente sobre os pais e cuidadores. Guedes et al. (2019) já apontavam a importância da supervisão: não basta limitar o tempo, é fundamental acompanhar o tipo de conteúdo consumido e oferecer alternativas de lazer.
Estratégias possíveis incluem:
Criar rotinas claras de uso das telas, estabelecendo horários e locais apropriados.
Incentivar atividades offline, como jogos de tabuleiro, leitura ou esportes.
Promover momentos em família sem tecnologia, como refeições ou passeios.
Dar exemplo, equilibrando também o uso de dispositivos pelos adultos.
Como ressaltam Joung, Oh e Lee (2023), programas de intervenção para crianças que já apresentam sinais de dependência digital devem ser flexíveis, respeitando necessidades emocionais e comportamentais. Atividades que promovam autoestima, autocontrole e contato com o mundo real são essenciais para reduzir a dependência.
Caminhos possíveis: educação e conscientização
Santos et al. (2022) e Yang et al. (2022) reforçam a importância de iniciativas educativas voltadas para o uso consciente da tecnologia. Isso significa incluir pais, professores e profissionais de saúde em uma rede de apoio que valorize tanto os benefícios quanto os riscos do mundo digital.
Algumas propostas incluem:
Campanhas de conscientização sobre os riscos do uso excessivo de telas.
Oficinas para pais, ensinando estratégias práticas de mediação tecnológica.
Programas escolares que incentivem atividades ao ar livre e práticas de mindfulness, ajudando as crianças a desenvolverem autorregulação emocional.
Pesquisas longitudinais que acompanhem os efeitos a longo prazo do uso de telas, contribuindo para políticas públicas mais eficazes.
Conclusão
O uso abusivo de telas por crianças é um desafio contemporâneo que exige atenção urgente. Estudos mostram que a exposição precoce, sem limites ou supervisão, pode gerar impactos significativos no desenvolvimento cognitivo, emocional e social. Ao mesmo tempo, quando usada de forma equilibrada, a tecnologia pode ser uma aliada no aprendizado e no entretenimento.
O ponto central está no equilíbrio. Pais, cuidadores e educadores precisam assumir um papel ativo, estabelecendo limites claros, oferecendo alternativas saudáveis e, sobretudo, dando exemplo. A sociedade também deve investir em pesquisas, políticas públicas e programas de intervenção que apoiem famílias nessa jornada.
Ao cuidar do presente, ajudamos a construir um futuro no qual crianças crescem mais saudáveis, conscientes e capazes de usar a tecnologia como ferramenta, e não como prisão.
*referência: Revista Foco - USO ABUSIVO DE TELAS: OS IMPACTOS PSICOLÓGICOS EM CRIANÇAS - DOI: 10.54751/revistafoco.v16n10-123







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